A terapeuta Silvana Cutolo fala em como ter uma gestação saudável com ajuda da ciência indiana.
1.Como o Ayurveda enxerga a gravidez?
Baseada em dois termos sânscritos, Ayu, que significa vida, e Veda, conhecimento ou ciência, o Ayurveda, ou medicina indiana, enxerga o indivíduo como um todo e inter-relação e integração com os outros seres, com a natureza e o Cosmos. Assim, busca promover um equilíbrio psicofísico e espiritual, por meio de técnicas, para manter a saúde e viver uma vida saudável e feliz. O Ayurveda apresenta 9 áreas, sendo que a ginecologia, obstetrícia e pediatria estão reunidos no Baala Chikitsaa ou Kaumar Britya, área focada na saúde da mulher no período pré-gestacional, na gestação, no trabalho de parto, no pós-parto e na saúde do bebê na vida intra-uterina e após o nascimento.
Para a Ayurveda, a gravidez é um momento especial para as mulheres. Durante os nove meses, a Ciência da Vida ressalta a importância da alimentação, limpezas e rotinas diárias do corpo e da mente, principalmente, quanto aos pensamentos para desenvolver qualidade de vida da mãe e bebê de maneira inteiramente sattvica, ou seja, com pureza, harmonia, saudável, bem-estar, equilíbrio, serenidade, entre outros aspectos, pois irão influenciar diretamente na formação do bebê, determinando toda uma vida.
A medicina indiana está estabelecida na doutrina tridosha, tendo os humores vata, pitta e kapha no controle, regulação e manutenção das funções no corpo. Quando há equilíbrio entre os doshas (humores, biotipos, veja tabela abaixo da matéria), então há saúde; mas quando ocorre desequilíbrio entre os humores, prevalecendo um ou dois, então a saúde torna-se debilitada, levando à enfermidade e à morte. Algumas condições podem alterar o equilíbrio entre os doshas como mudanças climáticas, alimentos inadequados, fadiga, mudanças psíquicas, vida sedentária.
O Ayurveda recomenda três práticas consideradas essenciais durante o período gestacional: ahar(nutrição), vihar (estilo de vida) e vichar (processo de pensamento) para auxiliar no desenvolvimento da mãe e bebê na vida intra-uterina, gerando no futuro uma criança que será um adulto com consciência de acordo com os ciclos do cosmos e integrado com o planeta e com os outros seres vivos.
2. A prakriti (físico) é formada em qual momento?
Segundo Samkhya, uma das bases filosóficas da Ayurveda, temos que viver de forma integral e de acordo com ritmo cósmico, uma vez que tudo no universo está interconectado e interrelacionado. A realidade do cosmos é dividida em 25 componentes (tattvas). Purusha é a Alma Universal e Prakriti é a Substância Cósmica e está constituída pelos três Gunas: 1) sattva – qualidade da verdade, virtude, beleza e equilíbrio; 2) rajas – qualidade da força e do ímpeto e; 3) tamas - qualidade que restringe, obstrui e resiste ao movimento. Prakriti não tem impulso para ação porque é inanimada e purusha dá vida à matéria através do sopro, que consideramos como prana. É somente através da união de purusha e prakriti que a vida se manifesta.
No Sushruta Samhita é relatado que durante o 1º mês se forma no útero uma substância gelatinosa (endométrio) para a implantação do embrião. Seis ou sete dias após a concepção, o embrião se encaixa na bolsa do útero. No final do 2º mês é que o embrião adquire a forma e o cérebro já está formado, com a capacidade de coordenar os outros órgãos do corpo através de impulsos elétricos. Mas é somente a partir do 4º mês, quando todos os membros e órgãos do embrião ficam fortes, que o feto adquire consciência, por causa da formação do coração. Segundo Sushruta Samhita, o coração é o assento da consciência, por onde o feto expressa seus desejos pelos prazeres sensoriais através das vontades da mãe. Durante o 5º mês, o bebê dorme, acorda consciente de sua existência inconsciente e muda de posição; no 6º mês desenvolve-se a faculdade da cognição. Os últimos três meses são o período em que se completa o aspecto físico do desenvolvimento no útero, assim a criança cresce, ganha peso e adquire controle muscular.
Podemos considerar que a matéria (prakriti) é inanimada e depende do sopro de vida (purusha), então quando o coração é formado e ocorrem os batimentos cardíacos temos o assento da consciência na vida intra-uterina, mas ainda temos a dependência da mãe, pois nos primeiros três meses, embrião e mãe estão presos por um cabo (parte da placenta em formação) chamado Rasvaha Nadi, que auxilia na nutrição (ahararasa virya) da mãe para o feto. Neste período de formação é muito importante que a gestante seja cuidadosa, vigilante e procure momentos de relaxamento com exercícios de respiração e meditações, ouvir músicas agradáveis, entoar mantras para acalmar o ambiente interno e externo.
3. A gravidez influencia na constituição da criança?
De acordo com Sushruta Samhita, a medicina indiana está baseada na prevenção das doenças, buscando o equilíbrio entre os doshas com práticas de higiene, purificação e rejuvenescimento. Isto é válido para preparo para a concepção, em que homem e mulher passam por um processo, tendo como objetivo a pureza de shuka (sêmen) e artava (óvulo), tornando-os saudáveis, fortes e com muito amor (prema). Além de todo preparo fisiológico, há o preparo através de mantras para assegurar a concepção com saúde física, mental e kármica do bebê.
As condições físicas e mentais da mãe apresentam impacto na concepção e na evolução da gravidez, tendo em conta que para o Ayurveda “tudo está interligado”, pois é a mãe que supre todas as necessidades básicas da criança e, portanto, não tem como se dissociar da condição da mãe.
4. Como ele ajuda nesse momento tão especial na vida da mulher?
Por meio do Ayurveda, temos acesso a diversas técnicas que possibilitam levar a gestante a níveis de relaxamento, contentamento, fortalecimento da relação mamãe e bebê, aumentando a produção de hormônios como a oxitocina, que é produzido no cérebro pelo hipotálamo, armazenado na hipófose e tem a função de promover as contrações uterinas no momento do parto e a liberação de leite durante a amamentação, fortalecendo os laços de carinho com o filho.
Por meio de toques suaves, após o 4º mês de gestação, devem ser realizados movimentos de massagem por toda a espinha dorsal, dando mais atenção às regiões da lombar, nas coxas, panturrilhas e pés com pouco óleo nas mãos do terapeuta. Além disso, pode praticar exercícios de respiração profunda e meditação, entoação de mantras e cânticos para futura mamãe e bebê. Os exercícios de respiração profunda auxiliam na eliminação de toxinas e na produção de oxigênio e nutrientes para mulher e seu filho.
5. Quais são os benefícios para a mãe e para o bebê?
Por meio da massagem, exercícios respiratórios e meditação, mas principalmente da alimentação sattvica, a mãe e o bebê são beneficiados com melhora da qualidade de sangue, fluidos, linfas e hormônios, promovendo a melhor formação dos tecidos, órgãos e corpo do bebê. De acordo com o Ayurveda, há uma necessidade de assimilar energia vital ou prana, uma vez que está ligada à respiração, oxigenação e circulação, sendo a cabeça, o local de prana. A energia vital tem sob controle as funções da mente, da memória, do pensamento e das emoções. O funcionamento fisiológico do coração também é governado pelo prana, e do coração prana penetra no sangue e controla a oxigenação em todos os dhatus (tecidos) e órgãos vitais.
6. A grávida pode usar ervas? Quais são melhores e quais são proibidas?
Devem ser utilizados sempre ervas que promovam o equilíbrio dos dosha, mas principalmente, que promovam a guna sattwa. Na Índia podem ser utilizadas as ervas que promovem a formação dos tecidos (dhatu) como Shatavari (racemosus aspargos), ashwagandha (Withania somnifera), bala, musali branco,musali salam e kapikachchu. As ervas que promovem pitta devem ser evitadas nos meses iniciais como cravo, canela, cominho, pimenta, noz-moscada, com exceção do último mês de gestação para estimular as contrações e trabalho de parto.
No Brasil, podem utilizara erva-cidreira e erva-doce, mas mesmo consideradas como ervas calmantes, as gestantes devem consultar o obstetra, pois é quem pode avaliar o estado de saúde, nutricional, incluindo os chás.
7.O que deve ser evitado durante a gravidez?
Álcool, tabagismo e drogas devem ser evitados para evitar anormalidades fetais. O Ayurveda sugere ainda evitar a atividade sexual após o quinto ou sexto mês, porque pode induzir sofrimento fetal. Outros aspectos devem ser evitados como: comer em excesso; dormir durante o dia e ficar acordado até tarde da noite; uso de roupas e cintos apertados; maus hábitos e comportamentos; discussões e brigas; e ruídos excessivos. Devem ser evitados os alimentos como as frituras, gordurosos e salgados.
8.Que tipo de dieta e tratamento é passado para a grávida?
Uma dieta saudável durante o período de gestação é uma necessidade, pois isso resulta em última análise, o crescimento fetal, a saúde materna e lactação pós-parto. A dieta para Ayurveda é considerada como a principal forma de equilibrar os doshas vata, pita e kapha. É uma fase importante na fase de formação do embrião que recebe alimento diretamente por percolação, sendo importante a mãe se alimentar de substâncias com bastante líquido como frutas suculentas, água de coco, leite.
Dieta deve ser na forma líquida ou semi-líquida, úmido, nutritivo, enriquecido com os seis sabores (rasas) e suplementados com algumas ervas medicinais e especiarias que são conhecidos por aumentar o apetite e poder digestivo.
De acordo com a Ayurveda, os alimentos mais saudáveis em todos os trimestres de gravidez: arroz, leite, trigo, frutas, passas, uvas, manga, ghee, e pequenas quantidades de açúcar em bruto (ou cristal), que não aumenta kapha.
Os cereais como trigo, aveia, centeio, ervilha seca, broto de feijão, pão integral, lentilhas, grão de bico, soja em grão possuem uma quantidade adequada de proteína. Devem ser consumidos vegetais e legumes frescos como folhas escuras (espinafre, couve, rúcula), tubérculos e raízes (inhames, mandioca, mandioquinha). Entre as frutas: banana, maçã e suco de laranja, limão, abacaxi. Também as frutas secas como tâmaras, figos, amêndoas.
9. A grávida pode fazer massagens, shirodhara, etc?
As massagens podem ser realizadas por especialistas em gestantes sempre com orientação do médico, zelando pelo conforto no momento da prática, propiciando o relaxamento do corpo e da mente.
Quanto ao shirodhara, quando o óleo é aplicado quente sobre a testa, tem como objetivo diminuir vata, promover melhor concentração e diminuindo o estresse, ansiedade, procurando o equilíbrio de prana na cabeça, importante nas grávidas com distúrbios como síndrome do pânico, convulsão, transtorno obsessivo e de humor. Mas antes do uso do shirodhara, a massagem é a principal técnica para estes casos.
10. E o pós parto? Como é tratado?
Vamos lembrar que no parto houve grande gasto energético, e nas próximas semanas, a mulher precisará restabelecer-se e cuidar do bebê. Depois do parto, a amamentação auxiliará o útero a se contrair mais rápido, e estas contrações podem ser sentidas por duas semanas, denominadas “dores residuais”, causadas pelo hormônio oxitocina, que regula o fluxo do leite. Portanto, cada vez que o bebê mamar, o útero sofrerá contração e voltará ao tamanho e forma normais. As contrações pós-parto são denominadas “contrações puerperais”. A mulher deve ter paciência neste momento, pois é um momento de reestruturação e restabelecimento do organismo, principalmente, do útero.
A mãe deve, neste momento de pós-parto, ter um período de relaxamento por 3 a 4 dias. A massagem é um instrumento de purificação, pois a mãe deve bem devagar realizar atividades leves. Assim, após estes dias, deve retornar as massagens e exercícios de respiração profunda por cerca de 40 dias. Neste momento, a massagem se concentra nas pernas, cintura, costas, pescoço e ombros para auxiliar o corpo da mãe a relaxar, promovendo saúde física e mental.
Entretanto, o mundo atual propicia o surgimento de problemas emocionais nos pais, como depressões, psicoses pós-parto e manifestações psicossomáticas associada ao nascimento do bebê. Dentre os sintomas estão irritabilidade, choro freqüente, sentimentos de desamparo e desesperança, falta de energia e motivação, desinteresse sexual, transtornos alimentares e do sono, a sensação de ser incapaz de lidar com novas situações.
O Ayuveda, com o uso de técnicas para minimizar os efeitos da depressão como massagens e oleação do corpo da mãe, aliada à prática de Yoga com exercícios de concentração, relaxamento e pranayamas, pode auxiliar na redução da depressão pós-parto. No caso das massagens, devem ser realizadas para estimular e promover a circulação de nutrientes e de fluidos, com efeito nos sistemas linfático e nervoso, melhorando os níveis de oxigênio, revigorando a química do sangue, levando toxinas para fora do corpo. Quanto à prática de asanas temos ustrasana (postura do camelo); viparita dandasana (postura invertida do bastão);sarvangasana (parada de ombros); setu bandha sarvangasana (postura da ponte). Estas posturas estimulam a abertura do peito, melhoram a respiração, promovem uma sensação de felicidade, aumentam a estabilidade e a confiança.
11. Você acredita que o Ayurveda pode ajudar as mães a ter crianças mais tranqüilas?
No atual estilo de vida que levamos nas grandes cidades, cercadas de poluição, ruídos, estresses, correria do dia-a-dia, o Ayurveda é a ciência que permite que a mãe ajuste o ritmo de vida de forma mais harmônica, volte-se para si, interiorize-se para ter uma melhor qualidade de vida. Mesmo que esta mãe não leve o método à risca, mas que ela consiga promover uma alimentação sattvica (equilibrada), receber massagens de relaxamento, ter momentos para praticar algumas posturas (asanas), exercícios de respiração e meditação promoverá uma gestação tranqüila, consequentemente, gerando um filho tranqüilo, saudável e com consciência.
Mas não podemos esquecer de que precisamos neste momento tão delicado da gestação da supervisão de médico ayurvédico, e devemos tomar cuidado com práticas inadequadas e inapropriadas com uso de ervas, massagens, alimentação que podem colocar em risco a gestação.
Silvana Audrá Cutolo é bióloga, mestre e doutora em Saúde Pública (USP), com especialização em Saúde da Mulher pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Terapeuta ayurvédica e professora de Yoga para gestantes e pós-parto.
Contato: silvana.cutolo@gmail.com.
Baseada em dois termos sânscritos, Ayu, que significa vida, e Veda, conhecimento ou ciência, o Ayurveda, ou medicina indiana, enxerga o indivíduo como um todo e inter-relação e integração com os outros seres, com a natureza e o Cosmos. Assim, busca promover um equilíbrio psicofísico e espiritual, por meio de técnicas, para manter a saúde e viver uma vida saudável e feliz. O Ayurveda apresenta 9 áreas, sendo que a ginecologia, obstetrícia e pediatria estão reunidos no Baala Chikitsaa ou Kaumar Britya, área focada na saúde da mulher no período pré-gestacional, na gestação, no trabalho de parto, no pós-parto e na saúde do bebê na vida intra-uterina e após o nascimento.
Para a Ayurveda, a gravidez é um momento especial para as mulheres. Durante os nove meses, a Ciência da Vida ressalta a importância da alimentação, limpezas e rotinas diárias do corpo e da mente, principalmente, quanto aos pensamentos para desenvolver qualidade de vida da mãe e bebê de maneira inteiramente sattvica, ou seja, com pureza, harmonia, saudável, bem-estar, equilíbrio, serenidade, entre outros aspectos, pois irão influenciar diretamente na formação do bebê, determinando toda uma vida.
A medicina indiana está estabelecida na doutrina tridosha, tendo os humores vata, pitta e kapha no controle, regulação e manutenção das funções no corpo. Quando há equilíbrio entre os doshas (humores, biotipos, veja tabela abaixo da matéria), então há saúde; mas quando ocorre desequilíbrio entre os humores, prevalecendo um ou dois, então a saúde torna-se debilitada, levando à enfermidade e à morte. Algumas condições podem alterar o equilíbrio entre os doshas como mudanças climáticas, alimentos inadequados, fadiga, mudanças psíquicas, vida sedentária.
O Ayurveda recomenda três práticas consideradas essenciais durante o período gestacional: ahar(nutrição), vihar (estilo de vida) e vichar (processo de pensamento) para auxiliar no desenvolvimento da mãe e bebê na vida intra-uterina, gerando no futuro uma criança que será um adulto com consciência de acordo com os ciclos do cosmos e integrado com o planeta e com os outros seres vivos.
2. A prakriti (físico) é formada em qual momento?
Segundo Samkhya, uma das bases filosóficas da Ayurveda, temos que viver de forma integral e de acordo com ritmo cósmico, uma vez que tudo no universo está interconectado e interrelacionado. A realidade do cosmos é dividida em 25 componentes (tattvas). Purusha é a Alma Universal e Prakriti é a Substância Cósmica e está constituída pelos três Gunas: 1) sattva – qualidade da verdade, virtude, beleza e equilíbrio; 2) rajas – qualidade da força e do ímpeto e; 3) tamas - qualidade que restringe, obstrui e resiste ao movimento. Prakriti não tem impulso para ação porque é inanimada e purusha dá vida à matéria através do sopro, que consideramos como prana. É somente através da união de purusha e prakriti que a vida se manifesta.
No Sushruta Samhita é relatado que durante o 1º mês se forma no útero uma substância gelatinosa (endométrio) para a implantação do embrião. Seis ou sete dias após a concepção, o embrião se encaixa na bolsa do útero. No final do 2º mês é que o embrião adquire a forma e o cérebro já está formado, com a capacidade de coordenar os outros órgãos do corpo através de impulsos elétricos. Mas é somente a partir do 4º mês, quando todos os membros e órgãos do embrião ficam fortes, que o feto adquire consciência, por causa da formação do coração. Segundo Sushruta Samhita, o coração é o assento da consciência, por onde o feto expressa seus desejos pelos prazeres sensoriais através das vontades da mãe. Durante o 5º mês, o bebê dorme, acorda consciente de sua existência inconsciente e muda de posição; no 6º mês desenvolve-se a faculdade da cognição. Os últimos três meses são o período em que se completa o aspecto físico do desenvolvimento no útero, assim a criança cresce, ganha peso e adquire controle muscular.
Podemos considerar que a matéria (prakriti) é inanimada e depende do sopro de vida (purusha), então quando o coração é formado e ocorrem os batimentos cardíacos temos o assento da consciência na vida intra-uterina, mas ainda temos a dependência da mãe, pois nos primeiros três meses, embrião e mãe estão presos por um cabo (parte da placenta em formação) chamado Rasvaha Nadi, que auxilia na nutrição (ahararasa virya) da mãe para o feto. Neste período de formação é muito importante que a gestante seja cuidadosa, vigilante e procure momentos de relaxamento com exercícios de respiração e meditações, ouvir músicas agradáveis, entoar mantras para acalmar o ambiente interno e externo.
3. A gravidez influencia na constituição da criança?
De acordo com Sushruta Samhita, a medicina indiana está baseada na prevenção das doenças, buscando o equilíbrio entre os doshas com práticas de higiene, purificação e rejuvenescimento. Isto é válido para preparo para a concepção, em que homem e mulher passam por um processo, tendo como objetivo a pureza de shuka (sêmen) e artava (óvulo), tornando-os saudáveis, fortes e com muito amor (prema). Além de todo preparo fisiológico, há o preparo através de mantras para assegurar a concepção com saúde física, mental e kármica do bebê.
As condições físicas e mentais da mãe apresentam impacto na concepção e na evolução da gravidez, tendo em conta que para o Ayurveda “tudo está interligado”, pois é a mãe que supre todas as necessidades básicas da criança e, portanto, não tem como se dissociar da condição da mãe.
4. Como ele ajuda nesse momento tão especial na vida da mulher?
Por meio do Ayurveda, temos acesso a diversas técnicas que possibilitam levar a gestante a níveis de relaxamento, contentamento, fortalecimento da relação mamãe e bebê, aumentando a produção de hormônios como a oxitocina, que é produzido no cérebro pelo hipotálamo, armazenado na hipófose e tem a função de promover as contrações uterinas no momento do parto e a liberação de leite durante a amamentação, fortalecendo os laços de carinho com o filho.
Por meio de toques suaves, após o 4º mês de gestação, devem ser realizados movimentos de massagem por toda a espinha dorsal, dando mais atenção às regiões da lombar, nas coxas, panturrilhas e pés com pouco óleo nas mãos do terapeuta. Além disso, pode praticar exercícios de respiração profunda e meditação, entoação de mantras e cânticos para futura mamãe e bebê. Os exercícios de respiração profunda auxiliam na eliminação de toxinas e na produção de oxigênio e nutrientes para mulher e seu filho.
5. Quais são os benefícios para a mãe e para o bebê?
Por meio da massagem, exercícios respiratórios e meditação, mas principalmente da alimentação sattvica, a mãe e o bebê são beneficiados com melhora da qualidade de sangue, fluidos, linfas e hormônios, promovendo a melhor formação dos tecidos, órgãos e corpo do bebê. De acordo com o Ayurveda, há uma necessidade de assimilar energia vital ou prana, uma vez que está ligada à respiração, oxigenação e circulação, sendo a cabeça, o local de prana. A energia vital tem sob controle as funções da mente, da memória, do pensamento e das emoções. O funcionamento fisiológico do coração também é governado pelo prana, e do coração prana penetra no sangue e controla a oxigenação em todos os dhatus (tecidos) e órgãos vitais.
6. A grávida pode usar ervas? Quais são melhores e quais são proibidas?
Devem ser utilizados sempre ervas que promovam o equilíbrio dos dosha, mas principalmente, que promovam a guna sattwa. Na Índia podem ser utilizadas as ervas que promovem a formação dos tecidos (dhatu) como Shatavari (racemosus aspargos), ashwagandha (Withania somnifera), bala, musali branco,musali salam e kapikachchu. As ervas que promovem pitta devem ser evitadas nos meses iniciais como cravo, canela, cominho, pimenta, noz-moscada, com exceção do último mês de gestação para estimular as contrações e trabalho de parto.
No Brasil, podem utilizara erva-cidreira e erva-doce, mas mesmo consideradas como ervas calmantes, as gestantes devem consultar o obstetra, pois é quem pode avaliar o estado de saúde, nutricional, incluindo os chás.
7.O que deve ser evitado durante a gravidez?
Álcool, tabagismo e drogas devem ser evitados para evitar anormalidades fetais. O Ayurveda sugere ainda evitar a atividade sexual após o quinto ou sexto mês, porque pode induzir sofrimento fetal. Outros aspectos devem ser evitados como: comer em excesso; dormir durante o dia e ficar acordado até tarde da noite; uso de roupas e cintos apertados; maus hábitos e comportamentos; discussões e brigas; e ruídos excessivos. Devem ser evitados os alimentos como as frituras, gordurosos e salgados.
8.Que tipo de dieta e tratamento é passado para a grávida?
Uma dieta saudável durante o período de gestação é uma necessidade, pois isso resulta em última análise, o crescimento fetal, a saúde materna e lactação pós-parto. A dieta para Ayurveda é considerada como a principal forma de equilibrar os doshas vata, pita e kapha. É uma fase importante na fase de formação do embrião que recebe alimento diretamente por percolação, sendo importante a mãe se alimentar de substâncias com bastante líquido como frutas suculentas, água de coco, leite.
Dieta deve ser na forma líquida ou semi-líquida, úmido, nutritivo, enriquecido com os seis sabores (rasas) e suplementados com algumas ervas medicinais e especiarias que são conhecidos por aumentar o apetite e poder digestivo.
De acordo com a Ayurveda, os alimentos mais saudáveis em todos os trimestres de gravidez: arroz, leite, trigo, frutas, passas, uvas, manga, ghee, e pequenas quantidades de açúcar em bruto (ou cristal), que não aumenta kapha.
Os cereais como trigo, aveia, centeio, ervilha seca, broto de feijão, pão integral, lentilhas, grão de bico, soja em grão possuem uma quantidade adequada de proteína. Devem ser consumidos vegetais e legumes frescos como folhas escuras (espinafre, couve, rúcula), tubérculos e raízes (inhames, mandioca, mandioquinha). Entre as frutas: banana, maçã e suco de laranja, limão, abacaxi. Também as frutas secas como tâmaras, figos, amêndoas.
9. A grávida pode fazer massagens, shirodhara, etc?
As massagens podem ser realizadas por especialistas em gestantes sempre com orientação do médico, zelando pelo conforto no momento da prática, propiciando o relaxamento do corpo e da mente.
Quanto ao shirodhara, quando o óleo é aplicado quente sobre a testa, tem como objetivo diminuir vata, promover melhor concentração e diminuindo o estresse, ansiedade, procurando o equilíbrio de prana na cabeça, importante nas grávidas com distúrbios como síndrome do pânico, convulsão, transtorno obsessivo e de humor. Mas antes do uso do shirodhara, a massagem é a principal técnica para estes casos.
10. E o pós parto? Como é tratado?
Vamos lembrar que no parto houve grande gasto energético, e nas próximas semanas, a mulher precisará restabelecer-se e cuidar do bebê. Depois do parto, a amamentação auxiliará o útero a se contrair mais rápido, e estas contrações podem ser sentidas por duas semanas, denominadas “dores residuais”, causadas pelo hormônio oxitocina, que regula o fluxo do leite. Portanto, cada vez que o bebê mamar, o útero sofrerá contração e voltará ao tamanho e forma normais. As contrações pós-parto são denominadas “contrações puerperais”. A mulher deve ter paciência neste momento, pois é um momento de reestruturação e restabelecimento do organismo, principalmente, do útero.
A mãe deve, neste momento de pós-parto, ter um período de relaxamento por 3 a 4 dias. A massagem é um instrumento de purificação, pois a mãe deve bem devagar realizar atividades leves. Assim, após estes dias, deve retornar as massagens e exercícios de respiração profunda por cerca de 40 dias. Neste momento, a massagem se concentra nas pernas, cintura, costas, pescoço e ombros para auxiliar o corpo da mãe a relaxar, promovendo saúde física e mental.
Entretanto, o mundo atual propicia o surgimento de problemas emocionais nos pais, como depressões, psicoses pós-parto e manifestações psicossomáticas associada ao nascimento do bebê. Dentre os sintomas estão irritabilidade, choro freqüente, sentimentos de desamparo e desesperança, falta de energia e motivação, desinteresse sexual, transtornos alimentares e do sono, a sensação de ser incapaz de lidar com novas situações.
O Ayuveda, com o uso de técnicas para minimizar os efeitos da depressão como massagens e oleação do corpo da mãe, aliada à prática de Yoga com exercícios de concentração, relaxamento e pranayamas, pode auxiliar na redução da depressão pós-parto. No caso das massagens, devem ser realizadas para estimular e promover a circulação de nutrientes e de fluidos, com efeito nos sistemas linfático e nervoso, melhorando os níveis de oxigênio, revigorando a química do sangue, levando toxinas para fora do corpo. Quanto à prática de asanas temos ustrasana (postura do camelo); viparita dandasana (postura invertida do bastão);sarvangasana (parada de ombros); setu bandha sarvangasana (postura da ponte). Estas posturas estimulam a abertura do peito, melhoram a respiração, promovem uma sensação de felicidade, aumentam a estabilidade e a confiança.
11. Você acredita que o Ayurveda pode ajudar as mães a ter crianças mais tranqüilas?
No atual estilo de vida que levamos nas grandes cidades, cercadas de poluição, ruídos, estresses, correria do dia-a-dia, o Ayurveda é a ciência que permite que a mãe ajuste o ritmo de vida de forma mais harmônica, volte-se para si, interiorize-se para ter uma melhor qualidade de vida. Mesmo que esta mãe não leve o método à risca, mas que ela consiga promover uma alimentação sattvica (equilibrada), receber massagens de relaxamento, ter momentos para praticar algumas posturas (asanas), exercícios de respiração e meditação promoverá uma gestação tranqüila, consequentemente, gerando um filho tranqüilo, saudável e com consciência.
Mas não podemos esquecer de que precisamos neste momento tão delicado da gestação da supervisão de médico ayurvédico, e devemos tomar cuidado com práticas inadequadas e inapropriadas com uso de ervas, massagens, alimentação que podem colocar em risco a gestação.
Silvana Audrá Cutolo é bióloga, mestre e doutora em Saúde Pública (USP), com especialização em Saúde da Mulher pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Terapeuta ayurvédica e professora de Yoga para gestantes e pós-parto.
Contato: silvana.cutolo@gmail.com.
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